Olá, pessoal! No segundo episódio de nossas Biodicas, nossa bióloga Beatriz Esteves explica as diferenças entre estes lagomorfos.
Vamos conferir?
Como diferenciar Coelho e Lebre?
Bom, ambos são mamíferos pertencentes da mesma família, a Leporidae ou leporídeos, possuindo mais de 50 espécies divididas entre 11 gêneros. Com exceção do gênero Lupus com 32 espécies, todos os demais são representados pelos coelhos (Brachylagus, Bunolagus, Caprolagus, Nesolagus, Oryctolagus, Pentalagus, Poelagus, Pronolagus, Romerolagus e Sylvilagus).
Morfologia
Uma das maneiras mais fáceis de conseguir diferenciar esses animais é pela morfologia. As lebres são maiores do que os coelhos, possuindo um total de 48 cromossomos. Seu comprimento médio é de 68 cm e possui pelos que variam entre os tons marrom-amarelado e marrom-acinzentado. Já o interior da pelagem é de cor branca acinzentada, com a parte superior sendo preta. Suas orelhas chegam a medir 98 mm e seu crânio articulado é um destaque. Durante o inverno, sua pelagem muda de cor para um tom mais próximo do branco-acinzentado. É um animal atlético, podendo realizar saltos de até 3 metros de altura e podem atingir os 64 km/hora. Não possuem dimorfismo sexual a olho nu.
Já o coelho possui 44 cromossomos, sendo menor do que a lebre e possui orelhas mais curtas. Mede em torno de 44 cm e seu peso varia de 1,5 até 2,5 kg. Porém, seu tamanho pode variar muito de acordo com a raça. Sua pelagem mistura cores como cinza, marrom e preto. Já a parte interior da pelagem possui tons de cinza claro. Há exceções dos coelhos domésticos gigantes, que ultrapassam o tamanho das lebres comuns, como o Gigante de Flandres (Bélgica), Gigante de Bouscat (França) e Continental Giant Rabbit (Reino Unido).
Distribuição
Sua distribuição geográfica também é diferente. Os coelhos europeus (Oryctolagus cuniculus) estão localizados na Península Ibérica, áreas pequenas da França e no norte de África, apesar de ser possível encontrar em outros continentes devido à intervenção humana. São eles que formam aquelas tocas complexas, principalmente em florestas e campos com arbustos, com preferência em viver perto do nível do mar, em zonas de solo macio e arenoso. Tentam sempre fugir de terrenos agrícolas já que acabam tendo suas tocas destruídas e ao longo dos anos aprenderam a conviver com o ser humano, o que acabam favorecendo a colonização de coelhos em novas áreas de forma inconsciente e despercebida. O coelho europeu é considerado o antepassado de todos os coelhos domésticos que conhecemos atualmente, que superam as 80 raças reconhecidas pelas distintas federações mundiais. Há também o coelho brasileiro, o Sylvilagus brasiliensis, também conhecido como tapiti-comum, candimba e coelho-do-mato, e foi descrito pela primeira vez por Linneu em 1753 em Pernambuco. O tapiti pode ser encontrado no Brasil, México, Guatemala, Peru, Bolívia, Paraguai, Norte da Argentina, e possivelmente em El Salvador, Honduras, leste da Nicarágua, leste da Costa Rica e Panamá. Atualmente se encontra na lista vermelha de IUCN, simbolizando que está em perigo de extinção.
Enquanto isso, as lebres europeias (Lepus europaeus) são encontradas ao longo da Grã-Bretanha, da Europa Ocidental, do Oriente Médio e da Ásia Central, também sendo inseridas em outros continentes de forma artificial pelo ser humano. São responsáveis por formar ninhos de grama achatada, com preferência em viver em campos abertos e pastagens. No Brasil há diversos relatos de plantações devastadas por conta do Lebrão, nome popular no Brasil dado à lebre europeia, principalmente nos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraná. Foi levada para Argentina e Chile visando à caça esportiva, teria se proliferado pelos países vizinhos e chegado ao Brasil nos anos 1950, por meio da fronteira com o Uruguai. A primeira publicação deste animal no país ocorreu em 1982 em Santa Vitória do Palmar (RS).
Comportamento
Os coelhos são vespertinos, noturnos e sociáveis. Suas tocas são grandes e elaboradas, abrigando até 10 animais. Machos se tornam mais territoriais durante o período de reprodução. Comunicam-se com sinais, cheiros e batendo patas no chão, além de emitir ruídos altos quando assustados, apesar de serem mais silenciosos do que as lebres.
As lebres são vespertinas, noturnas e solitárias, sendo encontradas durante o dia em época de reprodução. São presas de diversos animais, como raposas, falcões e corujas. Atingem alta velocidade ao detectar ameaças e esquivam-se dos predadores graças aos seus sentidos aguçados. Comunicam-se por ranger de dentes, dando sinal de perigo, e grunhidos guturais. Emitem também um grito muito agudo quando estão presas ou feridas.
Alimentação
Ambos são herbívoros e realizam a coprofagia, o que lhe permite absorver todos os nutrientes necessários dos alimentos. Enquanto os coelhos possuem preferência por grama, folhas, rebentos, raízes e a casca das árvores, as lebres preferem grama e cultivos, adicionando à sua dieta durante o inverno ramos, rebentos e a casca de arbustos, árvores pequenas e árvores frutíferas.
Reprodução
Os coelhos podem se reproduzir em qualquer época do ano, mas geralmente o fazem durante os dois primeiros trimestres. A gestação é curta, com uma média de 30 dias, e o tamanho da ninhada varia entre 5 e 6 indivíduos. São conhecidos pela sua grande capacidade reprodutora, pois podem ter várias ninhadas por ano. Os coelhos desmamam ao cumprir o primeiro mês de vida e sua maturidade sexual chega nos 8 meses. Ao contrário das lebres, a mortalidade dos coelhos selvagens é de cerca de 90% durante o primeiro ano de idade. Os filhotes nascem cegos, surdos e sem pelos, sendo completamente dependentes dos seus progenitores.
As lebres se reproduzem no inverno, entre Janeiro e Fevereiro, e também em pleno verão. A sua gestação dura uma média de 56 dias e o tamanho da ninhada pode variar de 1 a 8 indivíduos. O desmame ocorre quando os filhotes cumprem o primeiro mês de vida e sua maturidade sexual chega ao redor dos 8 ou 12 meses de idade. Os filhotes nascem totalmente desenvolvidos, prontos para levantar e realizar as funções próprias dos indivíduos adultos.
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